Capítulo 3

29/09/2013 10:20

Passaram-se longos oito anos desde a sua última estadia na belíssima e grandiosa Cidade Luz, o reduto das suas boas lembranças relacionadas à família Nikolaevich, principalmente ao pai, Alexander, um bom sujeito, como sempre, mesmo com o dinheiro que concentrara em suas mãos até o dia de sua morte. Ora, aquele homem fora-lhe inteiramente maravilhoso, defendendo sua gravidez precoce mesmo que ela não quisesse dizer o nome do pai da criança que carregava no ventre, como Sophia, a mãe, tanto insistia em saber. Era o único de toda a sua família com quem se dava bem, mesmo ele estando com a saúde incrivelmente debilitada, mesmo porque parecia ela ser a única disposta a entender as dores que o homem tinha – os outros não o davam atenção, já que estavam interessados apenas no dinheiro que estava à posse dele. Bando de idiotas, era o que Valia pensava.

 

A garota saíra claramente no prejuízo nessa situação toda. De alguma forma, Sophia havia arranjado uma forma de bloquear os bens da garota por ela ser menor de idade àquela época e não tinha condições de administrar os vinte e cinco por cento da herança que fora parar-lhe em mãos. Depois, quando esta possuía idade suficiente para tomar posse de sua herança, o dinheiro, há muito, havia sido mudado para outras contas, as quais ela não podia ter acesso jamais: sequer pudera ver a cor do dinheiro que herdara ou, ainda menos, os zeros em sua conta. Pouco depois, fora expulsa de casa, com o barrigão. E então, pareceu que Deus enviou-lhe o anjo-do-mal que Vladmir era: ele apresentou-a ao mundo ilegal com que trabalhava e deixou-a inteirada de tudo aquilo; também, tornou-a sua amante.

Dessa forma, conseguiu reerguer-se aos poucos. Ganhou treinamento e virou a caçadora-de-recompensas que trabalhava com Vladmir; virou sua preferida, também. De todas as mulheres que buscava, ele não pensava duas vezes e procurava Valia. E era daquela forma que ela o agradecia por ter sido acolhedor à ela.

— Quantas vezes você já esteve aqui antes? — o homem a perguntou.

— Passava minhas férias aqui, todas elas, desde o momento em que eu era um bebê de colo até completar a maioridade. Depois, nunca mais voltei aqui — ela respondeu, levando um copo de kirsch a boca. — É um dos poucos lugares no mundo que eu me sinto bem.

— Isto é bastante visível, minha menina — ele disse, ao pé do ouvido dela, fazendo-a se sentir arrepiada. — No entanto, uma coisa que não compreendi ainda é quando você colocará o seu plano em prática, sobre o seu…

— Não quero falar sobre isso agora — ela interpôs, rígida. — Viemos para cá com um único intuito: eu seduzir e extorquir dinheiro de Yves Pigasse, não é? Quer que eu o faça se apaixonar por mim, é isso? Não vai sentir ciúmes ou vontade de mata-lo se eu for para a cama com ele?

— Não me limito a sentimentos, linda — ele replicou, depositando um beijo no pescoço dela rapidamente. — O plano é o seguinte…

Ele começou a sussurrar no ouvido dela. Palavras rápidas e de fácil entendimento, mas ela fora educada para entender as mais diversas línguas e suas palavras mais difíceis, portanto ele não precisava fazê-la se sentir ignorante, quando não era. O plano parecia bastante agradável à Valia, que sorriu cheia de satisfação, logicamente. Era fácil, principalmente para aplicar com um tapado e viciado em sexo Pigasse, um dos homens mais ricos do mundo.

 

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Arrumou-se com elegância, mesmo que para exercer o serviço que Vladmir a esquematizou, não precisasse daquilo tudo. A maquiagem estava impecável e ela estava alinhada em um finíssimo (e caro) tailleur preto. Um primor de pessoa, ainda mais quando ela usaria seus dotes (principalmente os físicos) para atrair àquele homem cheio de dinheiro.

— Você está maravilhosa, minha linda — ela ouviu o elogio, raro, sobre sua beleza, partindo de Vladmir. — Não peque em nada. Estarei te vigiando.

— Como você vai entrar no coquetel?

— Tenho meus modos de fazê-lo.

Ela sorriu, pois com a afirmação de que ele estaria presente, sentia-se mais tranquila. Se fizesse algo de errado, ele a repreenderia com o olhar, apenas, e logo ela saberia que deveria mudar seu modo de atuar. Se bem que, para uma barwoman de um coquetel, ela não tinha muito que fazer e, dificilmente, conseguiria interagir mais profundamente com aquele homem, Yves. Teria que pensar em uma forma de sair de trás do balcão de bebidas apenas para conversar com ele; as improvisações eram com ela, sempre, e Vladmir jamais a havia repreendido por isso, porque ela era muito boa em tudo o que fazia, só que não era perfeita: se utilizasse suas habilidades para fazer o bem, se sairia, com certeza, bem, também, mas a ganância a atraia. Queria, precisava e tinha amor pelo dinheiro; sem ele as coisas não funcionavam muito bem, consigo.

— Boa sorte — ele disse, dando um beijo rápido nos lábios dela.

— Obrigada. E vê se não cai em tentação: estarei lhe observando.

Ele deu-a um sorriso tentador. Então seguiram para caminhos diferentes: a partir daquele momento, era cada um por si e Deus por todos.

 

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O nome Elizabeth Laurent estava indicado no armário de ferro forjado. Ela tinha em mãos as chaves que abriam os dois cadeados e o fez, tomando cuidado para seguir exatamente as instruções que lhe fora dada. Como Vladmir havia-a dito, uma foto de como a tal Elizabeth costumava se arrumar estava dentro do armário – mas, ora, mesmo que ali não estivesse, daria um ótimo jeito de interpretar, improvisaria.

Além do mais, sabia bem à língua francesa, pois praticamente havia sido criada entre aquele país e a Rússia, e saberia se passar bem por aquela garota, a tal Elizabeth. Situações como aquelas, ela passava rapidamente, não lhe era nada difícil: o problema era conseguir chegar à Pigasse sem chamar a atenção.

Levou um susto quando pegou a foto em mãos. Elizabeth era parecidíssima consigo, exceto pelo simples fato de Valia ter seus cabelos ruivos lisos e não usar óculos como a outra. De fato, Vladmir havia escolhido a dedo a pessoa a qual Valia substituiria, e ela não se interessava nenhum pouco com o que o homem havia feito com a garota: se tivesse a eliminado, com certeza aquela garota seria uma alma sofredora a menos no mundo. E Valia estava bem de prova que a vida não era muito generosa com as pessoas.

— Elizabeth — ouviu uma voz aguda, assim que colocou os óculos na face. — Adrien está lhe chamando. Parece que Albertine não vem.

Passou direto pela garota de fartos cabelos, mas tinha um sorriso levemente agradecido – não era boa com as palavras quando a situação era ter de munir-se de gratidão.

Não foi difícil encontrar o homem lhe indicado. Ele parecia ter algo como cinquenta anos, mas tinha os cabelos ainda bastante negros, e, nos olhos, imperavam os olhos azulados. era bonito, mas casado. e, para facilitar, ainda mais a localização daquele senhor, havia um crachá branco, adornando-lhe o nome Adrien Riverbel.

— Ora, você está ai. Pedi que Aimée a chamasse. Você cuidará de servir os drinques, já que Albertine não vem. Sei que não é muito boa com isso, mas… Você não vai poder ir ao bar hoje.

Aproximação forçada. Ela odiava aquilo, mas era a partir da falsidade sobre as fraquezas dos outros que conseguia sobreviver; sorriu nervosamente, fingindo-se levemente preocupada.

— Como assim, Adrien? É a única coisa que eu sei fazer!

O improviso pareceu cair-lhe bem, o que fez o homem passar o braço pelo ombro dela, de uma forma bastante amigável. Ela sorriu a ele em resposta rapidamente, mesmo estando desconfortável com a situação que ele à propunha.

— Será no improviso. Não temos outra pessoa e a desgraçada da Albertine simplesmente não deu as caras até agora. Você vai servir as bebidas.

— Ai, meu Santo Deus! Eu sou um desastre nessas horas, Adrien.

— É o que temos por enquanto. Sua amiguinha não é a melhor em cumprir o horário. Aliás, avise-a que ela não está mais trabalhando para mim: despedida por justa causa e nem adianta mais aparecer aqui.

— Sem problemas, então — ela completou, com um sorriso levemente formal.

A tal Elizabeth com certeza era uma garota querida ali, pois Adrien, principalmente este, parecia gostar muito dela, ou, então, ela era uma grande bajuladora de seu chefe. De qualquer forma, as situações ali presentes contavam (e muito) a favor dela.

Os minutos rapidamente se passaram; logo, viraram-se uma hora. Valia estava exercendo o trabalho que lhe fora destinado com maestria. Viu, aliás, de relance, Vladmir conversando com uma vadia qualquer que se oferecia à ele para fazer sexo e ele estava gostando daquilo, e isso só a fazia crer que não podia contar com aquele sujeito para adquirir aqueles mais de US$ 100 milhões; fazer aquilo seria muita, muita burrice.

Rondou o salão até encontrar um jovem rapaz exalando testosterona. Ele era louro, possuía olhos verdes marcantes e parecia um querubim de tão perfeito que era; também era másculo ao mesmo tempo e aquilo era percebível pelo porte físico que parecia ter já que seus ombros eram largos – devia ter por muito tempo praticado natação.

Quando passou rapidamente a frente dele, seus olhos se encontraram. Teve certeza de que aquele era o Yves tanto citado por Vladmir. Espasmos começaram a passar pelo corpo dela, num misto de nervoso, falsidade e mais alguma coisa a mais que ela não soube reconhecer.

O homem pegou uma taça de cristal sobre a bandeja que a garota segurava, sorriu-a e fez um breve erguer do cálice, como se a convidasse a brindar. Ela sorriu em resposta, mas tinha certeza de que aquilo não era meramente por educação: havia algo nele que mexia no mais profundo dela; talvez ele emanasse nela um pouco de desejo, já muito conhecido dele, pelo visto.

— Você está bem? — ele perguntou.

Só então, ela percebeu que o nervosismo dela transparecia em excesso – estava bem mais nervosa do que planejara estar.

— Desculpe-me, senhor, eu…

A situação era bem apropriada. Como estava aparentemente fingindo, podia adicionar mais uma dose de teatro.

Fingiu-se tonta, revirou os olhos e desmaiou aos pés dele, deixando a bandeja cair sobre si. Sabia que a atenção do homem recairia toda sobre ela, pois era a pessoa mais próxima dele naquele momento. E pela face assustada dele que viu antes de fechar os olhos, aquele sujeito havia caído como um patinho em toda aquela falsa história.